18 de maio de 2011

A ressaca é minha

Eu tinha medo de crescer. Lutava com forças e emoções para não sentir como gente grande. Abortava escolhas e interrompia ações. Voltava no tempo sem retroceder os anos, buscando sempre viver o dia de ontem que poderia ter sido vivido melhor. Não pensava no hoje e sim no que deixei de fazer. Uma vida voltada a reparar erros que eu não sabia que havia cometido, até o dia seguinte. Eram erros só para mim, que necessitava ficar presa a algo que não exigia quebrar barreiras e transpor muros. Mas isso não os fazia desaparecer. Com o passar do tempo, o tempo acumula-os até a sensação claustrofóbica de não caber no próprio corpo e ter a alma expelida por algum orifício. E torna-se cada vez mais difícil escapar desse percurso. O tempo age quando não evolui.
Fui até o meu limite. A pele rasgava por espaço e a respiração doía em cada célula viva. As que sobreviviam ao ar escasso desejavam a morte. Viver o que não pode ser revivido faz com que o corpo crie anticorpos ao novo e se envenene com a própria substância. Não sonhar com algo que não se tem fez do meu corpo uma carcaça dependente do que a mata, alimentando-se de si própria. No início, ainda era possível sentir certo prazer com isso, inventava uma lógica em que pensava ter controle. Manipulava o que vivi para não viver o que não sabia. Assim segui até esgotar a história e apenas restarem papéis amassados e linhas em branco. A caneta sempre esteve perto, mas a uma distância incalculável das minhas possibilidades. Os cotovelos criaram artrites que os impediam de esticar à frente, sob os olhos. Era preciso vencer a dor e, principalmente, criar coragem para lidar com o que viria depois. A dor nunca foi problema, mas o desconhecido sim.
Quando se dá o primeiro passo no escuro, seus olhos adaptam-se à intensidade de luz. Como subestimamos nosso corpo! Ele é tão sábio que preferimos não ouvi-lo. Nossa ignorância é nossa bênção e, ao invés de nos purificarmos através dela, engordamos com o pão e nos embebedamos com o vinho. Regurgitar o que não cabe é o início para começar a ingerir coisas boas. Mas não se engane, a ressaca não some.

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