O cansaço estende-se. Não sinto mais as pernas, somente uma dor que percorre cada polegada do que ainda está vivo. A vontade de fechar os olhos e deixá-los repousar é quase imperadora, mas as milhares de imagens na minha cabeça os mantém atentos, vidrados nos movimentos, ações, palavras.
Não consigo mais distinguir nada. Mãos me percorrem. Não são mais as mesmas, mas as antigas já não me satisfaziam. Quero fugir de todas as perguntas, encaminhá-las para vagar entre os becos dos quais não sei a saída. Pelo menos enquanto minhas pernas doem. Talvez uma analgésico punk-rock-pauleira ajude. Declarar palavrões a objetos não surtem mais efeito e não há energia para buscar respostas.
Eu havia prometido às marcas do tempo que seria mais suave com elas. Mas começo a desconfiar dessas marcas. Parecem apenas rabiscos na pele, cicatrizes de infância que diminuíram, perderam cor e textura. Viraram um rascunho sem relevância e serventia para elaborar algo concreto. Vou dizer outro palavrão para ver se melhora. Tá foda.
Surge uma trilha sonora para trazer aos ouvidos a sensação da perna. Arnaldo Antunes me perturba.
Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Não vai dar mais pra chorar
Nem pra rir
Socorro, alguma alma, mesmo que penada
Me empreste suas penas
Já não sinto amor, nem dor
Já não sinto nada
Socorro, alguém me dê um coração
Que esse já não bate nem apanha
Por favor, uma emoção pequena
Qualquer coisa
Qualquer coisa que se sinta
Tem tantos sentimentos, deve ter algum que sirva
Socorro, alguma rua que me dê sentido
Em qualquer cruzamento
Acostamento
Encruzilhada
Socorro, eu já não sinto nada
Socorro, não estou sentindo nada
Nem medo, nem calor, nem fogo
Nem vontade de chorar
Nem de rir
Alguém aperta o stop, por favor. Preciso dormir! Ainda tenho botas para limpar.
17 de abril de 2010
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É contagioso(rs)... Já desisti dos palavrõs e analgésicos. As imagens, ações, palavras, são escada pra pular por sobre os becos sem saída. Outro caminho se faz com novas marcas, somando-se e modificando as do passado, até que sejam elas também, de um futuro envelhecido: presente. A dor é sinal de que estou vivo, trato-a com ternura; quanto as suas pernas, segue outra do Arnaldo pra te consolar (ABC):
ResponderExcluirA
B
C
A A A
B
C
ACABA
gostei mt desse, um pouco diferente dos que vc costuma escrever, mas tao bom quanto!
ResponderExcluire a foto, ótima! Rs
seu texto ilustra uma superdosagem de orfenadrina... garanto
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